O ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO NO CONTEXTO DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA

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Resumo

O Estado Democrático de Direito evidencia a relevância do ordenamento jurídico, considerando o princípio da legalidade como base para a efetiva harmonia social, pautado no alvitre popular sob um prisma democrático. Observa-se que em havendo parcelamento ou pagamento integral dos tributos objeto de ação penal tributária, a pretensão punitiva do Estado é suspensa, desde que esse parcelamento seja realizado antes da denúncia criminal. Nessa perspectiva, evidencia-se que o Estado Democrático de Direito, tem o dever de resguardar os interesses coletivos, mesmo que para isso tenha que utilizar instrumentos contundentes para essa efetivação. Quem de qualquer modo incorrer em crimes contra a ordem tributária receberá, dentro da legalidade, as sanções previstas, de maneira que os interesses públicos sejam atendidos em detrimento do interesse puramente particular.

Palavras-Chaves: Ordem tributária; Crimes contra a ordem tributária; Tributos.

Abstract

The Democratic Rule of Law highlights the relevance of the legal system, considering the principle of legality as the basis for effective social harmony, based on popular divorce from a democratic perspective. Please note that when the installment or full payment of the attributes subject to tax criminal action, a punitive claim from the State is suspended, provided that this installment is made before the criminal complaint. In this perspective, evidence that the Democratic Rule of Law has a duty to safeguard collective interests, even if for that reason, use the blunt instruments for this realization. Whoever prosecutes crimes against a tax order received, legally, as sanctions applied, so that public interests are affected to the detriment of purely specific interests.

Keywords: Tax order; Crimes against the tribunal order; Tributes.

Introdução

O presente estudo visa, de maneira clara e concisa, apresentar a importância do Estado Democrático de Direito na consecução das garantias constitucionais e sua atuação contundente contra os crimes que afrontam a ordem tributária.

Inicialmente serão abordadas as configurações do Estado Democrático de Direito, estabelecido pela Constituição Federal de 1988, bem como a importância da soberania popular na condução das políticas públicas.

No segundo momento, será possível compreender brevemente o conceito e quais os principais tributos nacionais e a importância deles na busca estatal em proporcionar o bem estar para seus súditos.

Por fim, e não menos importante, será estudado os crimes contra a ordem tributária, sua previsão legal e a compreensão de alguns doutrinadores no sentido de que o crime tributário ocorre quando as condutas tipificadas em lei são realizados mediante dolo específico, isto é, o agente pratica o ato vislumbrando interesse próprio.

O Estado Democrático de Direito e Seus Fundamentos

Com escopo de apresentar a importância do Estado democrático de Direito nos crimes contra a ordem tributária, será abordado sem pormenorizar, a maneira como a nossa Carta Magna de 1988 retrata a configuração do Estado e sua relevância para o combate às afrontas das garantias constitucionais. Não se tem a pretensão aqui em esgotar o tema em questão, tendo em vista ser de densa definição.

O Estado Democrático de Direito evidencia a relevância do ordenamento jurídico, considerando o princípio da legalidade como base para a efetiva harmonia social, pautado no alvitre popular sob um prisma democrático.

Por força do art. , da Constituição Federal de 1988, o Brasil se constitui como um Estado Democrático de Direito, dos quais tem como principal finalidade promover o bem estar social, proporcionando condições para o efetivo desenvolvimento em todos os âmbitos, de maneira que a sociedade tenha o mínimo necessário para sua subsistência. Nesse sentido vejamos o disposto no imperativo legal supracitado, in verbis:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político.

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (grifou-se).

Vislumbra-se que a razão de ser do Estado Democrático de Direito está diretamente vinculado ao cumprimento das garantias fundamentais, respeitando o princípio da dignidade da pessoa humana, de modo a garantir os direitos individuais, coletivos, sociais e políticos. Lenza (2018, p. 1568), assevera que “estamos diante da democracia semidireta ou participativa, um ‘sistema híbrido’, uma democracia representativa, com peculiaridades e atributos da democracia direta”.

O Estado Democrático de Direito se configura em um poder uno, contudo, no seu efetivo exercício, ocorre uma mutação orgânica, ou seja, esse poder evidencia um desenho tripartite, quais sejam: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário, formando a União, que de maneira harmônica e independente, possuem atribuições especificas na consecução dos objetivos do Estado.

Importante consignar que cada Poder se submete aos imperativos constitucionais, no sentido de pautar suas funções nas garantias e princípios norteadores do Estado Democrático de Direito.

No entendimento de Lenza (2018, p. 571), a tripartição dos poderes teve suas bases na Grécia antiga por Aristóteles, “em que o pensador vislumbrava a existência de três funções distintas exercidas pelo poder soberano, quais sejam, a função de editar normas gerais e serem observadas por todos, a de aplicar as referidas normas ao caso concreto (administrando) e a função de julgamento”. Montesquieu aperfeiçoa o conceito aristotélico sobre a separação dos poderes, considerando que as funções estariam interligadas a três órgãos diferentes, autônomos e independentes entre si.

Carta Magna de 1988 delimitou claramente as funções de cada poder. No âmbito da União, tipicamente o Poder Executivo tem a missão de administrar, entretanto, em determinadas situação pode legislar e julgar. O Poder Legislativo assume a função típica em dizer o direito por meio de criação de leis abstratas. Por fim, e não menos importante, o Poder Judiciário aplica os ditames legais, ou seja, julgam as leis criadas pelo Legislativo e acatadas pelo Executivo.

Não há um poder sobreposto ao outro, todos possuem independência, no entanto, no exercício de suas funções deve prevalecer uma contínua harmonia, ou seja, o efetivo uso do sistema de freios e contrapesos, como bem preleciona Novelino (2014, p. 357): “no célere ‘sistema de freios e contrapesos’ (checks and balances) a repartição equilibrada dos poderes entre diferente órgãos é feita que nenhum deles possa ultrapassar os limites estabelecidos pela Constituição sem ser contido pelos demais”.

Ressalta-se que a Lei Maior de 1988, instituiu garantias individuais, coletivas, sociais e políticas a todos sob sua tutela.

Para a consecução dessas garantias, fazem-se necessários recursos pecuniários. Como obter esses recursos? O Estado possui instrumentos suficientes para resolver essa questão. Dentre os vários meios para obtenção de recursos, o Estado vale-se da arrecadação por meio de tributos.

Os tributos arrecadados são destinados para o atendimento das necessidades públicas, que compreendem a educação, saúde, segurança, etc., de maneira que as garantias constitucionais sejam devidamente observadas.

Insta consignar que o Estado Democrático de Direito tem o dever de vencer o desequilíbrio social e proporcionar à coletividade justiça social.

O Estado Democrático de Direito é soberano. Conforme Moraes (2005,p. 16) soberania “e a capacidade de editar suas próprias normas, sua própria ordem jurídica (a começar pela Lei Magna), de tal modo que qualquer regra heterônoma só possa valer nos casos e nos termos admitidos pela própria Constituição”.

A cidadania, outro fundamento do Estado Brasileiro, garante aos indivíduos direitos e deveres, onde a maior expressão de cidadania é vislumbrada na realização do sufrágio. Cidadania pressupõe existência de direitos e obrigações de caráter político.

Carta Magna de 1988 estabelece a dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito. Esse princípio compreende o ser humano como sendo o núcleo, de modo que a finalidade é proporcionar condições humanas de subsistência e respeito aos indivíduos. No entendimento de Moraes (2002, p. 128):

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

Em relação aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, evidencia o Estado como sendo exímio patrocinador da área social, possibilitando que todos tenham acesso ao trabalho uma vez ser encarado como uma mola propulsora que impacta diretamente o crescimento econômico e financeiro.

Outro pilar fundamental para sustentar a existência do Estado Democrático de Direito é o pluralismo político. Esse princípio não se confunde com a compreensão de variedades de partidos políticos, uma vez que esse pluralismo tem que ver com a abundância de ideias, múltiplos representantes, diversas maneiras de patentear o alcance da democracia aos indivíduos. O pluralismo político é a expressão da diversidade no Estado, não se trata somente da atividade político partidária.

O povo no contexto do Estado Democrático de Direito, é o titular da soberania, e como tal, possui instrumentos que efetiva sua participação no processo de decisão das políticas públicas.

A soberania popular é a expressão máxima da democracia, nesse sentido Silva (2014, p. 133) comenta:

A democracia, em verdade, repousa sobre dois princípios fundamentais ou primários, que lhe dão a essência conceitual: (a) o da soberania popular, segundo o qual o povo é a única fonte de poder, que se exprime pela regra de que todo o poder emana do povo; (b) a participação, direta ou indireta, do povo no poder, para que este seja efetiva expressão da vontade popular; nos casos em que a participação é indireta, surge um princípio derivado ou secundário: o da representação.

Depreende-se que o Estado Democrático de Direito possui princípios basilares fundamentais para sua efetiva existência, onde a liberdade democrática e a legalidade assumem protagonismo na consecução dos objetivos constitucionais. No entendimento de Silva (2014, p. 134) “a democracia – governo do povo, pelo povo e para o povo – aponta para a realização dos direitos políticos, que apontam para a realização dos direitos econômicos e sociais, que garantem a realização dos direitos individuais, de que a liberdade é a expressão mais importante.”

Os tributos brasileiros

Com o intuito de trazer elementos que contribuirão para uma melhor percepção da matéria proposta, serão elaboradas sucintas digressões sobre os principais tributos nacionais.

O art. , da Lei nº. 5.172/66 conceitua tributo como “toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.”

Restou claro e evidente que aos moldes da Carta Cidadã de 1988, o Estado tem a finalidade de proporcionar o bem comum a todos, com acesso à saúde, educação, segurança, infraestrutura, etc., de maneira que para alcançar essas garantias é preciso elaboração de atividades que gerem resultados pecuniários, ou seja, o Estado para subsidiar suas despesas, evidentemente necessita de gerar receitas.

Nessa perspectiva, Bueno (2014, p. 13), assevera que o Estado passa a realizar atividade financeira, que consiste em “busca de dinheiro pelo Estado para o custeio das suas necessidades, que resultarão no bem comum, ou seja, é o exercício pelo qual o Estado procura ‘receitas’ para custear as suas ‘despesas’”. As receitas públicas são originárias e derivadas, a primeira consiste na atuação do Estado na atividade econômica, seja na aferição de lucros ou venda de seus bens, por outro lado a segunda indica o Estado sendo soberano, onde são cobrados dos particulares tributos e multas vinculadas as ações financeiras, patrimoniais ou atos ilícitos.

Importante mencionar que segundo Sabbag (2017, p. 38), o Estado no exercício do seu poder de império possui legitimidade para cobrar tributos de seus súditos:

Quanto às receitas derivadas, o Estado, de modo vinculado (art. IICF), e valendo-se do seu poder de império, na execução de atividades que lhe são típicas, fará “derivar” para seus cofres uma parcela do patrimônio das pessoas sujeitas à sua jurisdição. Tais entradas intitulam-se “receitas derivadas” ou “de economia pública”, indicativas de receitas ordinárias obtidas à luz de imposição coativa e de manifestação soberana do Estado, no uso típico de sua autoridade ou de seu constrangimento, direcionados à invasão patrimonial dos particulares.

Os tributos instituídos pela Constituição Federal de 1988, consistem em impostos, taxas e contribuição de melhoria, conforme disposto no art. 145, da Constituição Federal de 1988, in verbis:

Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos:

I – impostos;

II – taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição;

III – contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

Vislumbra-se que todos os entes da Federação podem instituir tributos, cada um possui competência para cobrança de determinado tributo de acordo com os ditames da lei. A Constituição Federal de 1988, traz a previsão de cinco tipos de tributos: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições especiais.

O tributo utilizado vastamente pelo Estado para o custeio de suas despesas é o imposto. Isso ocorre devido a sua natureza não vinculativa, ou seja, o Estado pode aplicar os recursos advindos dos impostos em qualquer área.

A taxa, por sua vez, é um tributo vinculado à determinada atividade estatal em prol do contribuinte.

A contribuição de melhoria é o tributo que tem como fato gerador a valorização de imóvel em virtude de obras públicas.

Existem outros tipos de tributos, como os empréstimos compulsórios e as contribuições especiais, no entanto os supramencionados são os mais conhecidos devido serem amplamente utilizados pelo Estado.

Considerando tributos como toda prestação pecuniária compulsória, originado por um fato gerador, qualquer ação que visa burlar o devido pagamento, é crime. Nesse sentido passaremos a expor os crimes contra a ordem tributária.

Crimes Contra a Ordem Tributária

Os crimes contra a ordem tributária estão tipificados nos arts.  à , da Lei nº. 8.137, de 27 de dezembro de 1990. As condutas criminosas descritas no art. 1º são suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório

:Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I – omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

II – fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;

III – falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;

IV – elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;

V – negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa à venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.

Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.

Contudo, os crimes contra a ordem tributária não se limitam apenas aos imperativos da Lei nº. 8.137/90, o Código Penal também tipifica condutas que ofendem a ordem tributária, como bem preleciona Lima (2018, p. 48):

Abrange não apenas os crimes listados nos arts.  a  da Lei n. 8.137/90, mas também outros crimes previstos no Código Penal (v.g., art. 168-A, art. 334, art. 337-A, etc.). Diversamente das infrações fiscais que integram o Direito Tributário Penal, os crimes contra a ordem tributária só podem ser imputados ao agente a título doloso, sendo inadmissível eventual responsabilidade penal objetiva, porquanto manifestamente contrária ao princípio da culpabilidade.

O entendimento de alguns doutrinadores segue a linha de que, o crime contra a ordem tributária ocorre somente quando os atos tipificados são realizados mediante dolo específico, isto é, o agente pratica a conduta vislumbrando interesse próprio, nesse sentido Nucci (2017, p. 677) assevera:

É fundamental verificar a existência do elemento subjetivo do tipo específico (dolo específico), consistente na efetiva vontade de fraudar o fisco, deixando permanentemente de recolher ou tributo ou mantera sua carga tributária aquém da legalmente exigida. Esta é a única forma, em nosso entendimento, de evitar que o Direito Penal seja transformado em apêndice inadequado do Direito Tributário comum, buscando servir de instrumento do Estado para a cobrança de tributos.

Oportuno mencionar, que os crimes contra a ordem tributária se diferenciam das infrações fiscais. Conforme Bitencourt e Monteiro (2013), o crime tributário se caracteriza pela afronta a algum bem jurídico, enquanto as infrações fiscais representam simples descumprimento de dever exigido pelas normas tributárias. Os autores reforçam:

A persecução de delitos, dentre eles os crimes tributários, atende a princípios e regras de imputação específicos, propriamente penais, do que se conclui que a constatação da responsabilidade penal objetiva e subjetiva e a declaração de culpabilidade constituem pressupostos necessários e irrenunciáveis para a aplicação da pena.

Ressalta-se que para a comprovação dos crimes previstos contra a ordem tributária, faz-se necessário o lançamento definitivo, conforme Súmula Vinculante nº. 24 do STF: “Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. , incisos I a IV, da Lei 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo”.

Para Baltazar Júnior (2009, p. 417), prestar informações ao fisco sobre o fato gerador conforme os ditames legais, mas não realizar o pagamento, significa que o contribuinte está em inadimplência, não sendo ilícito criminal.

Os crimes contra a ordem tributária, tipificados na Lei nº. 8.137/90 não contemplou o crime de sonegação fiscal aos moldes da Lei nº. 4.502/64, no entanto, vislumbra-se que houve uma reformulação, onde os atos para o cometimento do crime de sonegação foram distribuídos entre os arts. 1º ao 3º, ou seja, o ordenamento jurídico especializou ainda mais para abarcar com maior amplitude os atos ilícitos contra a ordem tributária.

Fica evidente que a proteção da ordem tributária não se limita aos dispositivos da Lei nº. 8.137/90, mas a todo o sistema jurídico nacional, tendo em vista que a ordem tributária é garantida constitucionalmente, de maneira que é dever do Estado utilizar todos os instrumentos possíveis para coibir a prática de crimes, alem de garantir meios suficientes para a manutenção das políticas sociais e demais garantias estabelecidas pela Carta Magna de 1988.

Fraudar o sistema tributário significa um atentado à coletividade, pois se está ferindo o erário público, trazendo como consequência eventual falta de recursos para o financiamento das atividades estatais.

Interessante notar que a consumação dos crimes contra a ordem tributária, na compreensão do tipo penal tributário formal, ocorre quando o agente esgota todas as condutas descritas no normativo jurídico acarretando no resultado esperado. No tipo penal tributário material, o crime ocorre quando o fisco efetivamente realiza o lançamento definitivo, seja por omissão, redução, não declaração dos tributos correspondente ao fato gerador.

O art. 68 e 69, da Lei nº. 11.941/09 traz a previsão da suspensão da pretensão punitiva do Estado, in verbis:

Art. 68. É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1o e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, limitada a suspensão aos débitos que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento, enquanto não forem rescindidos os parcelamentos de que tratam os arts. 1o a 3o desta Lei, observado o disposto no art. 69 desta Lei.

Art. 69. Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no art. 68 quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento. (grifou-se).

Observa-se que em havendo parcelamento ou pagamento integral dos tributos objeto de ação penal tributária, a pretensão punitiva do Estado é suspensa, desde que esse parcelamento seja realizado antes da denúncia criminal.

Nessa perspectiva, evidencia-se que o Estado Democrático de Direito, tem o dever de resguardar os interesses coletivos, mesmo que para isso tenha que utilizar instrumentos contundentes para essa efetivação. Quem de qualquer modo incorrer em crimes contra a ordem tributária receberá, dentro da legalidade, as sanções previstas, de maneira que os interesses públicos sejam atendidos em detrimento do interesse puramente particular.

Considerações Finais

Sinteticamente, observa-se que o Estado brasileiro, por força da Lei Maior de 1988 estabeleceu o Estado Democrático de Direito, com claro objetivo de resguardar garantias que possibilitam o bem estar de todos os indivíduos sob sua proteção.

O Estado Democrático de Direito possui suas bases na evidência e relevância do ordenamento jurídico, considerando o princípio da legalidade como principio basilar para a efetiva harmonia social, pautado no alvitre popular sob um prisma democrático.

Restou claro que a Carta Magna de 1988 inaugura um modelo de Estado complexo, que se configura em um poder uno, mas com uma delimitação tripartite, quais sejam: Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário, formando a União, que de maneira harmônica e independente, possuem atribuições especificas na consecução dos objetivos do Estado.

Os tributos arrecadados são destinados para o atendimento das necessidades públicas, dessa maneira o Estado cria instrumentos necessários para o efetivo cumprimento dos seus objetivos sob a ratificação da soberania popular.

Contudo, ocorre que a arrecadação dos tributos muitas vezes não é pacífica, uma vez que alguns indivíduos agem para o benefício próprio burlando o ordenamento jurídico que disciplina os tributos, com condutas tipificadas como crime.

Além dos crimes previstos na Lei nº. 8.137/90 o Código Penal também estabelece importantes contribuições para coibir as práticas ilícitas contra a ordem tributária.

Observa-se que é necessário dolo específico para o cometimento de crime tributário, o mero fato de não pagar, uma vez devidamente declarado o fato gerador, se configura em inadimplência.

Portanto, a Constituição Federal de 1988, considerada como Constituição Cidadã, institui o Estado Democrático de Direito, onde o povo é soberano e a lei importante delimitador das ações estatais, cujo objetivo maior é o bem estar de todos.

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